Confie e obterá a confiança
ENTRE as bênçãos nada desprezíveis da vida acham-se os amigos em quem se possa confiar e que confiam uns nos outros. Houve um tempo em que as pessoas se inclinavam prontamente a confiar nos outros; a honestidade era algo um tanto corriqueira. Mas, não é mais. Pelo menos não nas grandes cidades. À medida que a violência e a perversidade aumentam, e toda forma imaginável de imoralidade e todas as espécies de desonestidade se tornam mais comuns, as pessoas se tornam cada vez mais suspeitosas e cada vez menos confiantes.
Assim, a revista Life de 11 de novembro de 1971, apresentou um artigo de capa intitulado “As cidades trancadas. O medo do crime cria um estilo de vida por trás do aço.” Falava de um prédio de apartamentos em que 17 dos 24 condôminos haviam sido roubados pelo menos uma vez e um deles já por três vezes. O artigo mostrava uma foto da porta de entrada de um apartamento defendida por cinco cadeados, dois olhos-mágicos, alarmes, correntes, barras, ferrolhos e armadilhas. E tudo isto em uma das melhores áreas residenciais de Nova Iorque. Desconfiança? Suspeita de estranhos? Não há dúvida disso.
E não apenas as casas são assaltadas. Em plena luz do dia apontam-se revólveres ou facas para as pessoas, assaltando-as. Dificilmente se passa uma semana sem que se ouça falar de um amigo ou parente que tenha sido roubado. Aconselha-se às pessoas a não se aventurarem a sair de casa sozinhas, em especial à noite, pois usualmente quem anda sozinho é espancado ou roubado.
Em vista da agravante situação do crime, a cautela é o proceder prudente. Mas, se não tivermos cuidado, esta cautela, esta desconfiança nos estranhos, pode influenciar toda a nossa relação com os outros. Se permitirmos isto, qual seria o resultado? Não faríamos com que até os possíveis amigos se tornassem desconfiantes, suspeitosos de nós também? É por isso que já se fala de todo o homem ser uma ilha e de as pessoas ficarem sozinhas embora no meio duma multidão.
Não podemos deixar de influenciar outros. É como até mesmo Jesus de Nazaré, o Filho de Deus, anunciou: “Parai de julgar, e de modo algum sereis julgados; e parai de condenar, e de modo algum sereis condenados. . . . Pois, com a medida com que medis, medirão a vós em troca.” — Luc. 6:37, 38.
Se formos indevidamente desconfiados ou suspeitosos de outrem, bem que poderíamos desencorajá-lo ou feri-lo de outros modos. A História registra muitos crimes que foram cometidos devido à falta de confiança, devido à suspeita. Os que esfaquearam Júlio César incluíam alguns dos próprios homens que ele considerava seus amigos. Por que o fizeram? Por suspeitarem das ambições dele. O Rei Herodes assassinou membros de sua própria família movido por suspeitas.
Entre as relações em que deve haver alto grau de confiança se acha o círculo familiar. Todos somos imperfeitos; todos cometemos erros. Mesmo se tivermos as melhores intenções, não somos sempre coerentes e, às vezes, talvez desapontemos um ente querido. Assim sendo, que bênção é quando aqueles que nos cercam mostram compreender nossas fraquezas e, assim, não são prontos a impugnar nossos motivos ou juízo, mas nos concedem o benefício da dúvida. Precisamos lembrar-nos de que, até quando as circunstâncias parecem suspeitosas, como Shakespeare mostrou em sua tragédia “Otelo”, ainda assim a pessoa pode deveras ser inocente.a
Tornaremos tanto nós próprios como os outros infelizes se formos suspeitosos, desconfiados. Por que não conceder-lhes o benefício da dúvida, avaliando que poderia haver circunstâncias atenuantes? Em especial quando sofrermos inconveniências ou formos provados de alguma forma pela fraqueza de outra pessoa, precisamos exercer cuidado de modo a não deixar que a impaciência nos torne duros e críticos. Por mostrar amor e interesse confiante, e exercer empatia — afirmando “Poderia ter acontecido comigo” — não só tornaremos os assuntos mais agradáveis nessa ocasião, mas tenderemos a colher dividendos pessoais. Quando “o tempo e o imprevisto” nos tornarem causa de provação para outrem, então poderemos esperar receber a mesma empatia confiante. Neste caso, também, aplica-se o princípio bíblico: ‘Colhe-se o que se semeia.’ — Ecl. 9:11; Gál. 6:7.
O mesmo princípio se aplica à relação entre pais e filhos. Não há dúvida hoje quanto à realidade do “conflito de gerações”. Os jovens proclamam sua rebelião pelas roupas que trajam, pela forma de pentearem o cabelo, pela linguagem que usam, por recorrerem a tóxicos e por muitas outras formas. Os pais se queixam, e de direito, de que seus filhos não lhes fazem confidências, que mostram falta de confiança neles. Mas, qual é mui provavelmente a causa? Não poderia ser que os pais, em primeiro lugar, não têm sido suficientemente íntimos, confidentes, honestos e confiantes para com seus filhos?
Mas, nem todos os pais têm motivos de queixas. Há pais que se mostram compreensivos, altruístas, profundamente interessados no crescimento mental, emocional, espiritual e físico dos filhos. Estes pais são como um livro aberto para os filhos, de modo que os filhos, naturalmente, confiam neles; são pais que colocam o bem-estar dos filhos acima das suas próprias conveniências e prazeres. Em resultado disso, seus filhos não são estranhos para eles.
O mesmo princípio se aplica também entre os membros duma congregação cristã. Quem quer obter confiança precisa mostrar-se confiante. Faça concessões às falhas dos outros, conceda-lhes o benefício da dúvida. Lembre-se de que é o privilégio dos fortes suportar as fraquezas ou as cargas dos que não são fortes, ser pacientes, longânimes, esperando o melhor. É melhor sofrer desapontamento e até perda por se ter confiança demais em um irmão cristão do que desencorajar ou fazer outrem tropeçar por se ser desconfiado. Sua atitude confiante fará com que outros confiem no leitor. A confiança é uma rua de mão dupla. Confie e obterá confiança. — Rom. 15:1.
[Nota(s) de rodapé]
a Nesta tragédia, o marido mata a esposa devido à ira ciumenta, apenas para descobrir que ela era inocente, e, assim, comete suicídio.