Ruturas metálicas devido à fadiga
SUBITAMENTE, sem aviso, a morte e a destruição assolaram o heliporto acima do Prédio da “Pan Am”, de 59 pavimentos, no meio de Manhattan, Nova Iorque, EUA. Quando os passageiros tomavam um helicóptero com destino ao Aeroporto Internacional J. F. Kennedy, a aeronave virou de pernas para o ar. Em questão de segundos, seus rotores, semelhantes a gigantescas cimitarras, despedaçaram quatro passageiros. Três morreram, ali mesmo na hora, e o quarto morreu num hospital. As lâminas esvoaçantes se fragmentaram, espalhando-se por ampla área. Os fragmentos que caíram na Avenida Madison mataram uma senhora e feriram outra. O que provocou tal desastre? Um relatório sobre as investigações preliminares indicava estar envolvida a fadiga metálica.
Considere outro acidente recente. Duas senhoras guiavam seu carro pela linda rodovia elevada sobre o mar, em Florida Keys, EUA. O carro subitamente saiu da pista e precipitou-se no mar. Felizmente, um mergulhador e um médico estavam por perto e as senhoras foram salvas. Parte da direção do carro apresentava falha. Por quê? Um exame superficial revelou os indícios de fadiga metálica.
A tragédia do heliporto de Nova Iorque, a queda da famosa Silver Bridge (Ponte de Prata), o misterioso desaparecimento dos primeiros Cometas britânicos sobre o Mediterrâneo — todos esses incidentes são relacionados a fadiga metálica.
As conseqüências da fadiga nos metais, como o câncer nos humanos, podem ser menos graves, caso haja detecção precoce. Também, como no caso do câncer, as curas são amiúde difíceis, e, às vezes, incertas. Infelizmente, os sinais identificadores são, amiúde, obliterados pelo acidente. Mais freqüentemente, passam despercebidos devido à falta de investigadores especialmente treinados.
A Estrutura dos Metais
Para se entender a fadiga metálica, temos de examinar sua estrutura. Desde o tempo de Tubalcaim, o primeiro metalúrgico da história, até os nossos dias, não houve nenhuma explicação satisfatória para a fadiga destas substâncias. (Gên. 4:22) Apenas no passado recente é que o conhecimento da estrutura básica dos metais foi suficientemente aperfeiçoada para fornecer um entendimento plausível disso. Mesmo hoje em dia, quando há rutura de um feixe de molas ou eixo, ainda ouvimos as pessoas dizer que tal parte foi cristalizada. Isto não poderia ser a causa da rutura, visto que o material já estava cristalizado antes da rutura.
Quando os metais fundidos começam a resfriar e a solidificar-se, começam a formar-se diminutos cristais. Estes crescem em tamanho e número até que a massa completa seja cristalizada. No entanto, com exceção dos materiais ultrapuros, usualmente há outras substâncias presentes que não se ajustam à estrutura cristalina normal. Algumas destas são rejeitadas e tendem a acabar entre os cristais, ou grãos, no que é chamado de “limite de grão”. Ainda outros materiais continuam em forma distribuída por toda a estrutura. As partes sólidas são chamadas “inclusões”. Até mesmo buracos ou vazios são deixados. Um metal resfriado deste modo, segundo se diz, é uma “estrutura fundida”. Embora o metal possa ser usado desta forma, não raro será trabalhado ainda mais de outro modo. Tais operações podem incluir uma ou mais das seguintes: forja, laminação, recalque, usinagem e/ou retificação. Tais passos talvez sejam apenas o começo, visto que muitas operações são amiúde necessárias. Cada passo pode influir, e usualmente influi, na vida da fadiga potencial do metal.
Como Talvez Comece a Fadiga Metálica
Se simples barra metálica for submetida a tração, a partir de suas extremidades, usualmente poderá suportar essa carga pelo menos uma vez, até bem perto de sua tenacidade plena ou esforço máximo (limite de resistência). No entanto, se for submetida repeti das vezes a estiramentos ou trações suficientemente grandes para surgirem trincas de fadiga, então talvez reste apenas a parte inferior do esforço máximo previsto (ou limite de resistência), e cargas contínuas por fim resultarão em rotura. A razão deste reduzido esforço útil reside, em parte, na natureza básica da estrutura metálica. Sob cargas repetidas, alguns cristais talvez deslizem ou se desloquem simplesmente, um plano atômico (grade espacial) deslocando-se sobre o outro. Certos planos cristalinos oferecem menos resistência a tal deslizamento do que outros. Poder-se-ia compará-los a diminutos baralhos que deslizassem mais facilmente em um plano do que em outro Os cristais usualmente são orientados a esmo, e o deslizamento original pode ser provocado por alguma irregularidade no padrão atômico. Tal irregularidade pode resultar duma inclusão ou vazio, ou de alguma outra concentração de tração que provoque a ultrapassagem do limite de cisalhamento. Cargas repetidas provocam a formação de uma série de tais deslizamentos ou deslocamentos. Continuam acumulando-se até que o cristal se fragmenta. Tal fragmentação causa a distorção de ainda outros cristais, e o processo continua até que se forme uma abertura ou racha (ou trinca). A racha, ou rachas, continua a crescer até que a parte metálica não mais suporta a carga, resultando a rutura por fadiga.
Há outros meios, também, pelos quais a fadiga pode começar. Exemplifiquemos: micro ou pequenas rachas que começam nos limites de granulação. As rachas podem ser apressadas por alguma ação química. Assim, há, várias causas, já identificadas, da fadiga, embora ainda haja muito o que aprender. O resultado geral, contudo, é progressivo enfraquecimento da estrutura metálica por algum processo de micro-rachas durante a carga.
Como Identificar Uma Rutura por Fadiga
Embora, em alguns casos, considerável dose de experiência seja necessária para identificar a fadiga como causa da rutura, há certas caraterísticas gerais que podem ser úteis. Concorda-se que a fadiga é um processo progressivo. Também, o aumento das rachas usualmente progride de forma intermitente. Esta configuração de aumento intermitente é, às vezes, evidenciado nas superfícies trincadas das partes quebradas. Tais configurações tendem a assemelhar-se a semicírculos concêntricos irregulares, o centro dos semicírculos sendo a origem da rutura. Se esta configuração de “concha de ostra” estiver presente nas superfícies rompidas, a causa é, provavelmente, a fadiga.
Reconhecimento da Fadiga no Projeto de Máquinas
Iniciada a Revolução Industrial, começaram a ser construídos poderosos motores e locomotivas a vapor. Daí começaram a ocorrer inexplicáveis ruturas em algumas partes mecânicas. August Wohler, na Alemanha, foi um dos primeiros a identificar tais ruturas como fadiga e a registrar suas descobertas. Foi mais além e demonstrou as ruturas, usando corpos de provas tirados dos eixos das locomotivas. Embora o fenômeno da fadiga metálica fosse então reconhecido, coube à época da Primeira Guerra Mundial e dos primeiros carros, trazer tal problema à atenção do homem comum. Naqueles carros, era comum haver ruturas por fadiga em virabrequins, eixos e molas.
Por volta da Segunda Guerra Mundial, o reconhecimento do problema da fadiga metálica aumentou. O uso amplo de aeronaves focalizou a atenção na tenacidade, no peso e na confiabilidade quanto à fadiga. Atualmente, com o uso maior de máquinas, inclusive de helicópteros, as exigências quanto ao estilo e confiabilidade são ainda maiores. Os governos e as firmas investigam intensamente esse problema. Equipamento sofisticado foi desenvolvido e acha-se agora em uso, para estudo de projetos e protótipos.
Um resultado de todo esse esforço é que os manuais e folhetos sobre projetos melhoraram. Tais manuais fornecem, entre outras coisas, limites da tensão de carga para determinados materiais, de modo que possam ser usados com certa segurança. Chamam-se “limites de resistência”. Uma representação simples é indicada no gráfico acompanhante. Com tais informações, poderia parecer que tal problema fosse essencialmente solucionado. Simplesmente aja dentro dos limites de segurança e acabarão as preocupações com a fadiga.
Infelizmente, contudo, os dados e as informações fornecidos não podem abranger todas as condições de operação. No uso real duma parte metálica, talvez não consigamos prever com exatidão o espectro da carga. As tensões amiúde são complexas e envolvem combinações de estiramento ou tração, compressão e cisalhamento. Também, é importante saber a ordem em que ocorrem as cargas baixas e elevadas, se a probabilidade da vida da fadiga há de ser calculada. Grande parte das informações se deriva do trabalho com aquilo que poderíamos chamar de materiais “planos”. São materiais que não dispõem de concentrações de tensão, tais como orifícios, endentações, rebites ou soldas. Todos esses, em geral, tendem a reduzir os limites básicos de resistência. Todavia, mesmo nos materiais simples, há virtual infinidade de variações de qualidade. Tais variações no tamanho dos cristais, nos números e tipos de inclusões, da dureza e da tensão interna, complicam todos os problemas do projeto e da fabricação.
Equacionar Problemas do Projeto e da Fabricação
Muitas das máquinas e aparelhos que adquirimos foram projetados e fabricados já na expectativa de que algumas partes deles apresentariam ruturas pelo uso. Por exemplo, tem sido costumeiro projetar certas partes dos automóveis para durar 160.000 quilômetros. Já então os revestimentos estariam gastos e a carroçaria enferrujada e danificada. Por outro lado, o limite sobre a vida de fadiga de partes duma aeronave é imposto pelo peso. Mais material talvez fosse vantajoso no projeto. Todavia, qualquer peso excessivo limita seriamente a quantidade de carga e de combustível transportados.
Nas máquinas em que a vida e a propriedade estão em jogo, é imperativo que, se possível, evitem-se acidentes graves. Devido a tais considerações, surgiram duas filosofias gerais de projeto — os conceitos fail-safe (falha com segurança) e safe-life (resistência máxima).
Quanto ao conceito de “falha com segurança”, vários membros paralelos são usados para suportar determinada carga. Assim, caso um membro falhe, os outros podem suportar a carga até que os consertos dele se tornem possíveis. Outro meio empregado é o de prover “crack stoppers” (inibidores de trinca). Segundo este método, projeta-se parte com uma área engrossada para reduzir a tensão. Possivelmente, emprega-se forte reforço, para o qual se transfere a carga. No caso deste conceito de “falha com segurança” a inspeção é importante.
Não raro não é possível usar um projeto de “falha com segurança”. Um eixo ou engrenagem dificilmente pode ser fabricado com membros paralelos de suporte da carga. Para este tipo de parte, é preciso usar o conceito de “resistência máxima”. Neste processo, emprega-se o projeto de tolerância de danos, junto com rigorosos testes. No caso de tais partes, é mister ter cuidado especial durante toda a produção e montagem.
Às vezes empregam-se tanto os conceitos de “falha com segurança” como de “resistência máxima”. De novo, a inspeção é capital, se exeqüível. A junção que sofreu rotura no helicóptero do Prédio da “Pan Am” alegadamente deveria ser inspecionada quando completasse 9.900 horas de uso. No entanto, segundo certo relatório, só tinha sido usada por 7.000 horas. Por isso, quando as inspeções programadas não são bastante freqüentes, poderá ocorrer um desastre.
Processos Especiais de Proteção
Às vezes podem ser usados processos especiais que são úteis na prevenção de acidentes, devido às ruturas por fadiga. Nem sempre são empregados por causa de seu custo adicional, a falta de conhecimento ou de facilidades, ou porque não se aplicam ao caso. Também, há certos meios de se predizer a rutura.
Um dos processos importantes que pode amiúde ser usado é o de injeção de ar. Fornece o que pode ser considerado de camada externa compressora para a parte. Visto que as ruturas por fadiga em geral se originam quando a parte é submetida a repetidas tensões nominais de carga, a injeção de ar auxilia por manter, pelo menos, a superfície da parte sob compressão.
Outro processo é às vezes chamado de “autofrettage”. Embora este processo tenha sido usado em canhões, o princípio possui muitas aplicações. A idéia é sobrecarregar a parte de forma excessiva, de modo que certas áreas de alta tensão cedam. Daí, ao liberar-se a carga, estas áreas que cederam entram em compressão. Tais áreas de compressão localizada fornecem proteção por reduzirem a tensão durante o uso normal de serviço.
A sobrecarga pode ter outros efeitos benéficos, se realizada antes de a parte ser utilizada. Isto se dá se a parte empregar certos tipos de ganchos. Exemplo é o das juntas de rebites. Devido ao imperfeito encaixe de roscas, certos rebites talvez suportem a parte principal da carga. Por sobrecarregar o conjunto, porém, as áreas muito carregadas cedem, distribuindo a carga.
Há outros meios usados para impedir as ruturas por fadiga metálica, e usualmente são muito úteis. Incluem o alívio da tensão, depois da solda, e o polimento, com a remoção dos orifícios e buracos, a fim de reduzir as concentrações de tensão.
O Que Pode Fazer?
Embora o projetista e o fabricante possam ter contribuído muito para ajudar a impedir as ruturas, há muita coisa que poderá fazer. Eis aqui algumas dicas:
1. Opere seu equipamento dentro das cargas e velocidades recomendadas.
2. Quando conserta equipamentos, evite fazer profundos riscos, talhos ou marcas de lima, pelo menos nas partes críticas.
3. Evite o superaquecimento, visto que isto poderá influir na dureza do metal e reduzir sua tenacidade utilizável.
4 Proteja o metal da ferrugem e da corrosão por pontos.
5. Proteja as partes móveis de certas substâncias químicas, tais como os ácidos. No caso de alguns metais, a exposição poderá provocar a entrada do hidrogênio atômico, predispondo tal parte às quebras e à rutura precoce. Outro efeito das substâncias químicas poderá ser causar a corrosão de tensão.
Que Dizer dos Acidentes Causados Pela Fadiga Metálica?
Podem ser evitados os acidentes provocados pelas ruturas causadas pela fadiga metálica? Sim, com o tempo.
Os acidentes tendem a ser provocados por formas de egoísmo, ignorância e descuido. Às vezes, o desejo incontrolado de lucros, um conhecimento ainda deficiente de projetos, e o descuido por parte dos que fabricam e utilizam tal equipamento, deixam-nos vulneráveis às ruturas provocadas pela fadiga metálica. No entanto, um novo sistema de coisas está às portas. Naquele sistema, prometido pelo Criador do homem, todas as formas de egoísmo serão eliminadas. O conhecimento aumentará, inclusive o que envolve o projeto de peças. Também, os que então fabricarem e usarem os equipamentos farão isso tendo presente a segurança de todos.
[Gráfico na página 19]
(Para o texto formatado, veja a publicação)
Tensão máxima, kg por mm2 (ou libra por polegada quadrada)
Rutura Esperada
Limite de Resistência
Limites Seguros de Operação
500.000
1.000.000
Ciclos até Rutura
Método de organizar dados sobre a fadiga.
[Foto na página 19]
CONFIGURAÇÃO DE OSTRA