A revolução genética — promete muito, mas há crescentes preocupações
A REVOLUÇÃO genética está saindo do laboratório e entrando na vida cotidiana. Já lhe afetou de alguma forma? Considere só:
▲ Atualmente, bactérias geneticamente modificadas podem produzir em abundância valiosas drogas medicamentosas, tais como a insulina, o hormônio do crescimento humano e uma vacina para a hepatite-B.
▲ Nos Estados Unidos, iniciaram-se experiências clínicas com duas vacinas em potencial contra a AIDS, ambas criadas através da genética.
▲ Tornam-se possíveis alguns testes pré-natais de numerosas doenças herdadas, uma vez que se encontram no ADN (DNA) humano “marcadores” para tais doenças. Introduziu-se um teste pré-natal altamente sensível e muito rápido para a anemia falciforme.
▲ Os verdadeiros genes que causam certas doenças hereditárias já foram identificados e, em alguns casos, reproduzidos pela clonagem, por meio da engenharia genética.
▲ Alguns cientistas, animados pelo sucesso em descobrir genes, estão promovendo a idéia de um “Projeto Manhattan” da genética, a fim de determinar o código preciso de todos os 100.000 genes, mais ou menos, nos 23 pares de cromossomos que constituem o ADN humano. O Governo Federal dos EUA concordou em patrocinar tal projeto. Se for aprovado pelo Congresso, espera-se que leve 15 anos e custe vários bilhões de dólares.
▲ Em 1987, o Departamento de Patentes dos EUA declarou que já estava pronto para considerar os pedidos de patentes de animais que tivessem sido alterados através da tecnologia da engenharia genética, criando um aceso debate entre cientistas e peritos em ética. Em abril de 1988, concedeu-se uma patente assim para um rato.
Produção em Larga Escala de Fármacos
Talvez o resultado mais imediato da alteração genética seja em sua área de produção de fármacos (drogas medicamentosas). Espera-se que a venda de fármacos produzidos pela engenharia genética ultrapasse um bilhão de dólares por ano, no futuro próximo. Mas, este êxito não surgiu da noite para o dia.
Tome-se a insulina, por exemplo. Um dos primeiros resultados práticos da tecnologia do ADN-recombinante foi encontrar o gene (localizado no cromossomo 11) produtor da insulina humana e então injetar cópias dele na bactéria comum E. coli. Estas bactérias alteradas conseguem produzir grandes quantidades de insulina, com a exata estrutura da molécula da insulina humana. Que espantoso!
Levou vários anos, contudo, para que tal tecnologia saísse do laboratório, fosse submetido a testes clínicos, percorrendo todo o processo de aprovação pela FDA [Administração de Alimentos e Remédios] dos EUA, e, por fim, entrasse em produção em larga escala, tornando-se amplamente disponível. A disponibilidade de tal insulina não significa que se tenha encontrado a cura do diabetes, como qualquer diabético lhe poderá dizer. Com efeito, ao passo que o produto “pode apresentar certas vantagens para as pessoas recém-tratadas com insulina, ou alérgicas à costumeira insulina de boi ou de porco, não é necessário para a maioria das pessoas que tomam preparados convencionais”, segundo o Dr. Christopher D. Saudek, diretor do Centro Johns Hopkins de Tratamento do Diabetes.
Outras perspectivas muito animadoras para os fármacos produzidos pela engenharia genética incluem o TPA (ativador de plasminogênio dos tecidos) e a IL-2 (interleucina-2). O TPA ajuda a dissolver os coágulos sanguíneos. Já foi aprovado pela FDA para tratamento de emergência de vítimas de ataques cardíacos. O IL-2 pertence a uma família de fatores que atuam primariamente entre os glóbulos brancos. Promove o crescimento e o desenvolvimento das células T, as quais, por sua vez, ajudam a combater a doença. Só o tempo dirá se estes novos fármacos cumprem o prometido.
Testes Genéticos de Doenças
Em 1986, os pesquisadores encontraram um elo entre a genética e o câncer. Isolaram (no cromossomo 13) e clonaram um gene que, segundo crêem, impede um câncer hereditário da vista chamado retinoblastoma. Genes suspeitos também estão sendo investigados, em busca de possíveis vínculos com o câncer dos ossos e a leucemia mielóide crônica.
Cresce a evidência de que os genes podem promover o câncer, bem como suprimi-lo. Médicos da UCLA (Universidade da Califórnia, em Los Angeles) descobriram que uma célula normal pode ter um ou dois oncogenes (formadores de tumores), mas uma célula de câncer pode ter até dez vezes tantos. Mais oncogenes parecem significar tumores mais perigosos, de modo que tais pesquisadores estão agora contando os oncogenes em seus pacientes para determinar qual é o melhor modo de tratá-los.
Tudo isto é torturante, mas o câncer não é a única doença com um componente genético. Um informe da revista Science alistava nada menos de 21 distúrbios neurológicos, e os genes ou cromossomos que parecem estar envolvidos nestas doenças. A lista inclui algumas doenças mortíferas, tais como a doença de Alzheimer, a doença de Huntington, e a distrofia muscular de Duchenne; tampouco cessa a lista com os problemas neurológicos. Têm-se também encontrado marcadores genéticos para a fibrose cística, a doença policística dos rins e muitas outras.
Tudo isto eleva a intrigante perspectiva dos testes genéticos que poderiam dizer-nos se nós, ou nossos filhos, corremos um alto risco de apresentar uma das mais de 3.000 doenças hereditárias conhecidas. Mas nem tudo é tão simples assim. Nem todas essas doenças são causadas por um único gene. Quando estão envolvidos múltiplos genes e outros fatores, como parece ser o caso na doença de Alzheimer, os testes seriam difíceis. Em outros casos foram encontrados os genes reais que provocam a doença, e até mesmo se fez a clonagem deles, porém, com mais freqüência, conhece-se apenas a sua localização geral. O que se tem indicado não é o próprio gene, mas um segmento próximo de ADN (DNA), chamado de marcador genético.
“O mapeamento do genoma humano, conforme existe hoje, é muito vago”, informa Jan Hudis, Editor de Informações Científicas da “March of Dimes Birth Defect Foundation” [Fundação Marcha dos Dez Centavos de Dólar Para a Cura dos Defeitos Congênitos], dos EUA. Ele acrescenta que isso “poderia ser comparado a uma fotografia de satélite tirada quando uma nuvem baixa obscureceu tudo, exceto as mais altas cadeias de montanhas”.
O Dilema dos Testes Genéticos
A promessa de amplos testes genéticos é enorme. “Em alguns casos”, comenta o jornal The New York Times, “as descobertas tornaram possível identificar portadores saudáveis do caráter da doença que poderiam transmiti-la a seus filhos, ou fazer diagnósticos pré-natais desse quadro clínico”. Trata-se, certamente, de informações valiosas, mas, como o Times prossegue dizendo: “Estes são triunfos da ciência, mas eles não subentendem rápidas vitórias contra tais doenças.” Uma coisa é identificar uma doença que apresenta causas genéticas. Outra coisa, bem diferente, é curá-la.
Resta a esperança de que, com o tempo, sejam encontrados os verdadeiros genes que causam mais doenças hereditárias. O entendimento daquilo que os genes devem supostamente fazer, e do que saiu errado, bem que poderá levar a terapias jamais imaginadas.
No ínterim, os pais que se submetem a testes genéticos se vêem confrontados com decisões difíceis, inclusive, talvez, a pressão de abortar um filho por nascer. Para alguns deles, o aborto está fora de cogitação, mas, quanto a outros, a escolha é complicada, quando são testados os marcadores, e não os genes reais. A presença dum marcador nem sempre significa que o gene esteja presente.
“Todo ano, localizamos cada vez mais marcadores genéticos de doenças de um único gene”, observa Jeremy Rifkin, crítico veemente da biotecnologia. “Onde é que se traça a linha divisória? Existem muitos milhares de características recessivas. A leucemia pode matar seu filho aos três anos, a doença do coração, aos trinta, e a doença de Alzheimer, aos cinqüenta. Em que ponto se diz não? A sociedade em geral poderá até aprovar legislação proibitiva, ou obrigar os pais a não transmitir certas características, devido aos custos de saúde com que, provavelmente, ela terá de arcar.” Seria, deveras, um triste paradoxo, se a tecnologia, que visava salvar vidas e minorar o sofrimento, provocasse mortes desnecessárias de crianças por nascer porque alguém achava que seus caracteres genéticos eram “indesejáveis”.
Deixar Isso Para os Advogados
É interessante que o próprio êxito da nova biotecnologia criou um conjunto inteiramente novo de problemas — lutas quanto ao dinheiro que se possa ganhar. “Será que o litígio está-se tornando o principal produto da revolução biotecnológica?”, perguntou Science News, observando que as grandes companhias farmacêuticas já estão processando umas às outras, e às menores empresas de alteração de genes por causa dos direitos legais da IL-2, um hormônio do crescimento humano produzido pela engenharia genética, e de outros fármacos comercializáveis.
As disputas de patentes quanto a fármacos são, sem dúvida, bastante complexas, mas o que acontece quando as pessoas começam a tentar patentear animais geneticamente alterados, segundo permitido por uma norma do Departamento de Patentes dos EUA, ano passado? Pesquisadores em San Diego, EUA, tiveram êxito em injetar genes do vaga-lume em algumas plantas do fumo, criando plantas que reluzem no escuro! Outras plantas do fumo receberam um gene duma bactéria que fabrica uma proteína que é tóxica para as lagartas que comem tais plantas. Cientistas de Maryland, EUA, apresentaram um porco transgênico — um porco que possui um hormônio de crescimento duma vaca.
Preocupação com as Tendências
Esta tendência de misturar os genes de espécies não-aparentadas deixa muita gente preocupada. Alguns grupos de fazendeiros “vêem a engenharia genética como mais uma duma longa lista de tecnologias que favorecem as grandes empresas agropecuárias, prejudicando as pequenas fazendas”. Grupos de defesa dos direitos dos animais “vêem-na como o cúmulo da afronta à integridade dos animais”, declara The New York Times.
“Nós não sabemos o que é a vida”, escreve o Dr. Erwin Chargaff, professor emérito de bioquímica da Faculdade de Medicina da Universidade de Colúmbia, “e, todavia, nós a manipulamos como se fosse uma solução salina inorgânica”. O Dr. Chargaff prossegue: “O que eu vejo a caminho é um gigantesco matadouro, um Auschwitz molecular, de onde serão extraídos valiosas enzimas, hormônios, e assim por diante, em vez de dentes de ouro.”
Outros sentem-se alarmados com o que consideram ser perigos desconhecidos, envolvidos quando organismos geneticamente modificados escapam para o meio ambiente. Em 1985, uma empresa da Califórnia, EUA, foi multada em US$ 13.000 por ter liberado bactérias alteradas sem permissão. Quando os tribunais da Califórnia finalmente aprovaram similar liberação em dois campos de provas, em 1987, alguns vândalos prontamente arrancaram as plantas. A preocupação do público foi de novo ressaltada, em 1987, quando um patologista vegetal de Montana, EUA, inoculou alguns olmos com bactérias geneticamente alteradas. O cientista, neste caso, foi repreendido por decidir não adiar seu experimento até ele ser revisto pela Agência de Proteção ao Meio Ambiente, dos EUA.
O “Santo Gral”?
No ínterim, aceleram-se as pesquisas genéticas. O Ministério de Energia dos EUA já começou a fazer investigações preliminares que visam determinar a seqüência precisa de todos os três bilhões de bases químicas existentes no ADN (DNA) humano. Trata-se dum projeto de monumental escala. Uma lista impressa das informações contidas no ADN humano encheria 200 grandes listas telefônicas. No passo atual, tal projeto custaria incontáveis bilhões de dólares e seriam necessários séculos para terminar, mas, espera-se que rápidos progressos na tecnologia seqüencial acelerem as coisas, reduzindo esse tempo para 15 anos, de acordo com a última estimativa. O Ministério de Energia solicitou uma verba de US$ 40 milhões para esse projeto, e espera aumentar tal verba para US$ 200 milhões anuais. É preciso obter a aprovação do Congresso americano.
O que se irá comprar com todo esse dinheiro? Alguns cientistas compararam o conhecimento pormenorizado do ADN humano a um “Santo Gral” da genética humana. Estão convencidos de que será inestimável instrumento para que se entenda toda função humana. Mas outros não estão tão certos disso.
“Ao passo que poucos investigadores questionam a vantagem de se conseguir a seqüência dum gene de reconhecido interesse, existe grave dúvida sobre o valor imediato de se saber a precisa seqüência dos nucleotídeos do inteiro genoma”, comenta Jan Hudis, o qual acrescenta que, na atualidade, “espera-se que somente diminuta fração do genoma total forneça informações que tenham valor médico imediato”.
Seria, deveras, uma triste ironia se fundos urgentemente necessitados para as pesquisas médicas fossem consumidos num megaprojeto científico de valor duvidoso.
“Queremos Bebês Perfeitos”
Em que direção caminha a revolução genética? Sem dúvida, contém grande potencial positivo em forma de melhores fármacos, melhores cuidados médicos, e maior entendimento de como funcionam as coisas vivas. Mas, existe um outro lado da revolução.
“Queremos bebês perfeitos”, diz Jeremy Rifkin. “Queremos plantas e animais perfeitos. Queremos uma economia melhor. Não existem más intenções nisso. A estrada do Brilhante Novo Mundo está cheia de boas intenções.
“Passo a passo, estamos decidindo rearranjar partes do código genético das coisas vivas. Surgem duas perguntas importantes: Se iremos manipular o código genético, que critérios estabelece esta sociedade para determinar quais são os genes bons e os ruins, os úteis e os que apresentam disfunções? E eu gostaria de saber se existe alguma instituição em que qualquer pessoa aqui confiaria, como autoridade final, para decidir os esquemas genéticos para uma coisa viva?”
Estas perguntas merecem respostas. Quem se acha melhor equipado do que o Criador do ADN para determinar o que é um gene bom ou ruim? É ele quem conhece as mais profundas operações do código genético, conforme demonstrado por Davi no Salmo 139:13-16: “Mantiveste-me abrigado no ventre de minha mãe. Elogiar-te-ei porque fui feito maravilhosamente, dum modo atemorizante. Teus trabalhos são maravilhosos, de que minha alma está bem apercebida. Meus ossos não te estavam ocultos quando fui feito às escondidas, quando fui tecido nas partes mais baixas da terra. Teus olhos viram até mesmo meu embrião, e todas as suas partes estavam assentadas por escrito no teu livro, referentes aos dias em que foram formadas, e ainda não havia nem sequer uma entre elas.” Não prefere confiar Nele como autoridade final que decide quais os esquemas genéticos de todas as coisas vivas?
[Destaque na página 13]
Quem deve decidir que genes são bons e que genes são ruins?