Cigarros: rejeita-os?
Uma nação que ajudou a difundir o uso do tabaco no mundo está tomando a dianteira em avisar dos seus perigos.
“Estima-se que nos anos 90, nos países desenvolvidos, o tabaco causará aproximadamente 30% das mortes entre pessoas de 35 a 69 anos, fazendo dele a maior causa de morte prematura no mundo desenvolvido.” — THE NEW ENGLAND JOURNAL OF MEDICINE
“O TABACO”, escreveu um historiador, “não tem história textual antes da descoberta da América”. Nativos do Caribe ofereceram-no a Cristóvão Colombo. A sua exportação garantiu a sobrevivência de Jamestown, o primeiro núcleo colonial britânico permanente na América do Norte. As suas vendas ajudaram a financiar a Revolução Americana. E os antigos presidentes americanos George Washington e Thomas Jefferson eram plantadores de tabaco.
Em tempos mais recentes, Hollywood usou o cigarro como símbolo de romantismo, charme e varonilidade. Soldados americanos ofereciam cigarros às pessoas nos países em que lutavam. E, alegadamente, depois da Segunda Guerra Mundial os cigarros eram moeda corrente “de Paris a Pequim”.
Mas as coisas mudaram. Em 11 de janeiro de 1964, o conselheiro para assuntos de saúde do governo americano apresentou um relatório de 387 páginas ligando o fumo com enfisema, câncer pulmonar e outras doenças graves. Logo uma lei federal exigia a colocação do aviso “Alerta: fumar pode ser prejudicial à sua saúde” em todos os maços de cigarro vendidos nos Estados Unidos. Atualmente, o fumo alegadamente é responsável por umas 434.000 mortes por ano, nos Estados Unidos. Isso é mais do que o total de americanos mortos em batalha nesse século!
Impostas restrições
Mais de dez anos atrás, a famosa estação de inverno de Aspen, no Colorado, EUA, proibiu fumar em seus restaurantes. Desde então, alas para não-fumantes tornaram-se mais comuns em restaurantes, no trabalho e em outros locais públicos. Anos atrás, um californiano perguntou a sua filha onde ficava a área dos não-fumantes num restaurante da Virgínia. “Papai”, respondeu ela, “esta é a terra do tabaco!” Na sua visita seguinte, metade desse restaurante estava reservada para os não-fumantes. Recentemente, ele observou que ninguém mais fumava ali.
Mas, reservar áreas para fumantes não resolveu o problema. Grandes cartazes oficiais colocados ao longo das rodovias principais da Califórnia perguntavam: “Você acha que a fumaça sabe que não deve sair da área de fumantes?”
Quando a cidade de Nova York proibiu fumar nos seus grandes restaurantes, os proprietários protestaram alegando que isso afastaria os turistas da Europa, onde, segundo disseram, há poucas restrições contra o fumo. No entanto, uma pesquisa anterior havia revelado que 56% dos americanos mais provavelmente iriam a um restaurante em que fumar fosse proibido, ao passo que apenas 26% estariam menos dispostos a fazer isso.
Um cartaz nos vagões do metrô de Nova York diz: “Em qualquer idioma, a mensagem é a mesma: Não fume, em qualquer hora e em qualquer lugar, nas estações ou nos vagões. Obrigado.” Essa mensagem não aparece só em inglês, mas em mais 15 outros idiomas.
É esse assunto realmente tão sério assim? É. Se 300 pessoas morressem numa catástrofe, isso seria notícia por vários dias, talvez semanas. Mas, segundo um artigo na JAMA, a revista da Associação Médica Americana, uns 53.000 americanos morrem por ano dos efeitos a longo prazo de respirar a fumaça dos cigarros de outras pessoas. Isso, diz o artigo, faria da inalação dessa fumaça de tabaco de segunda mão, ou ambiental, “a terceira maior causa evitável de morte, depois do fumar ativo e do álcool”.
Crianças: vítimas indefesas
Que dizer de fumar no lar? Healthy People 2000, uma publicação do governo americano que estabeleceu alvos para reduzir “mortes prematuras e doenças ou deficiências desnecessárias”, disse: “O uso do tabaco é responsável por mais de uma em cada seis mortes nos Estados Unidos, e é a mais importante causa evitável de morte e doença na nossa sociedade.”
Disse mais: “Fumar durante a gravidez responde por 20-30% dos recém-nascidos com deficiência de peso, 14% dos partos prematuros e uns 10% das mortes de recém-nascidos.” Mães que fumam, disse a publicação, podem transmitir os componentes da fumaça do tabaco à criança, não apenas pela amamentação, ou por fumar perto dela, mas também por “colocar o bebê num quarto em que pouco antes alguém tenha fumado”.
O pai também está envolvido. A mesma publicação aconselhou: “Se os que têm contato com crianças acham que precisam fumar, deviam fazer isso fora da casa ou em áreas que não levem a fumaça para onde a criança está.” O risco aumenta com o número de adultos que fumam no mesmo recinto e com o número de cigarros consumidos. Assim, Joycelyn Elders, ex-conselheira para assuntos de saúde do governo americano, disse: “Seus filhos são as vítimas inocentes do seu vício.”
Outros também correm risco. Um comercial de TV patrocinado pelo governo, na Califórnia, mostrava um homem idoso, sentado sozinho. Ele dizia que sua esposa ‘implicava’ com ele, por causa do cigarro. “Ela até ameaçou não mais me beijar, se eu não largasse o vício. Eu dizia que os pulmões eram meus, e que a vida era minha. Mas, eu estava enganado. Não larguei. Eu não imaginava que a vida que eu perderia não seria a minha . . . foi a dela.” Olhando com tristeza para uma foto dela, o idoso acrescentava: “Minha esposa era a minha vida.”
Mudança de conceito
Avisos assim têm contribuído para um grande declínio no hábito de fumar, nos Estados Unidos. Surpreendentemente, uns 46 milhões de americanos — 49,6% dos que já fumaram — largaram o vício!
Contudo, as indústrias fumageiras dispõem de enormes verbas de publicidade e contra-atacam. Com isso, a diminuição no hábito de fumar desacelerou. Joseph A. Califano Jr., do Centro de Vício e Abuso de Substâncias, da Universidade de Columbia, Nova York, disse: “A maior ameaça à saúde pública por parte da indústria fumageira [é] seu uso de propaganda e técnicas de venda voltadas para crianças e adolescentes que representam uma nova safra de viciados em seus produtos mortíferos.”
A revista JAMA disse: “Calculadamente 3000 jovens, a maioria crianças e adolescentes, tornam-se fumantes regulares todo dia. Isso representa cerca de um milhão de novos fumantes por ano, que parcialmente substituem os aproximadamente dois milhões de fumantes que a cada ano morrem, ou que largam o vício.”
Mais da metade dos fumantes americanos começam por volta dos 14 anos. David Kessler, diretor do Food and Drug Administration, órgão fiscalizador dos alimentos e remédios dos EUA, disse que das 3.000 crianças que a cada dia começam a fumar, quase 1.000 acabarão morrendo de doenças ligadas ao fumo.
Se esses números nos incomodam, seria bom nos lembrarmos de que os nossos filhos imitam o nosso exemplo. Se não queremos que fumem, não devemos fumar.
Vendas no estrangeiro
Embora o consumo de cigarros nos EUA tenha diminuído, ele aumenta em outros países. Segundo o jornal Los Angeles Times, “as exportações mais do que triplicaram, e as vendas das indústrias fumageiras americanas no estrangeiro aumentaram vertiginosamente”. A revista The New England Journal of Medicine disse que, nos países em desenvolvimento, “dá-se pouca ênfase aos perigos do fumo”, permitindo às companhias fumageiras “uma rápida penetração nos mercados estrangeiros”.
No entanto, Patrick Reynolds, filho de Richard J. Reynolds Jr., e descendente do fundador da empresa que produz os cigarros Camel e Winston, disse que uma de cada cinco mortes nos Estados Unidos é causada pelo fumo. Reynolds teria dito também que o fumo causa mais mortes a cada ano do que a cocaína, o álcool, a heroína, o fogo, o suicídio, o homicídio, a Aids e os acidentes de carro em conjunto, e que é a causa de morte, doença e vício mais evitável de nossa era.
Parece estranho que a nação que ajudou o mundo a aprender a fumar tenha desenvolvido uma crescente oposição nacional ao tabaco? Nesse caso, seria bom nos perguntar: ‘Quem melhor saberia a razão disso?’
A revista Modern Maturity falou de uma mulher que havia fumado por mais de 50 anos. Ela disse: “Uma vez viciada, você está enlaçada.” Mas, ela conseguiu livrar-se da mística que inicialmente a levou a fumar, analisou as suas desculpas para continuar fumando e daí parou de fumar.
“Tente”, escreveu ela. “É maravilhoso.”
[Destaque na página 23]
A fumaça não se confina à área de fumantes
Fumar durante a gravidez responde por cerca de 10% das mortes de recém-nascidos
[Quadro/Foto na página 22]
ALERTAS CONTRA O CÂNCER
Os seguintes alertas são dos folhetos Facts on Lung Cancer (Fatos sobre Câncer Pulmonar) e Cancer Facts & Figures—1995 (Fatos e Números sobre o Câncer — 1995):
• “Esposas não-fumantes de maridos fumantes correm risco 35% maior de contrair câncer pulmonar.”
• “Calculadamente 90% dos casos de câncer pulmonar em homens e 79% em mulheres são causados pelo cigarro.”
• “Para o fumante de dois maços por dia e que fumou mais de 40 anos, a taxa de mortalidade por câncer pulmonar é cerca de 22 vezes maior do que a de um não-fumante.”
• “A melhor defesa contra o câncer pulmonar é não começar a fumar, ou parar imediatamente.”
• “Não existe cigarro seguro.”
• “Usar tabaco para mascar ou em pó (snuff) aumenta o risco de câncer na boca, na laringe, na garganta e no esôfago, e é um hábito altamente viciador.”
• “O risco adicional de câncer na bochecha e na gengiva pode ser quase 50 vezes maior entre os usuários de snuff de longa data.”
• “Quem pára de fumar, independentemente da idade, vive mais tempo do que quem continua. Os fumantes que param antes dos 50 anos têm metade do risco de morrer nos 15 anos seguintes em comparação com os que continuam a fumar.”
[Quadro/Foto na página 24]
O DILEMA DO PLANTADOR
Há gerações o tabaco sustenta famílias cujas lavouras são pequenas demais para produzir uma renda mínima sem o reforço de alguma cultura adicional. Isso obviamente representa um problema de consciência para muitas pessoas. Stanley Hauerwas, professor de ética teológica na Universidade de Duke, fundada por um dos barões do tabaco, disse: “Acho que a grande angústia das pessoas que plantam tabaco é [que] . . . quando começaram a cultivá-lo, não sabiam que ele poderia matar alguém.”