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  • A fé é prática

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  • A fé é prática
  • A Sentinela Anunciando o Reino de Jeová — 1981
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A Sentinela Anunciando o Reino de Jeová — 1981
w81 15/12 pp. 6-11

A fé é prática

TESTEMUNHO DOS CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO

CAMPOS de concentração. O que lhe lembra isso?

Talvez se recorde de fotografias de pessoas amedrontadas tiradas de vagões de carga e encaminhadas para a sua morte. Ou de presos esfomeados, sobrecarregados de trabalho, obrigados a viver com o seu próprio excremento e sofrendo de doenças. Ou de experiências médicas desumanas, ou de fornos que cremaram incontáveis corpos humanos.

Essas coisas fazem parte do quadro desses campos terríveis.

Contudo, há outra coisa a considerar. Horríveis como eram os campos nazistas, centenas de milhares de homens e mulheres neles estavam procurando viver. Lutavam dia após dia para se manterem vivos, apesar de doenças, espancamentos, exaustão e matanças indiscriminadas. Procuravam comer, manter-se aquecidos e evitar doenças. Tinham de trabalhar, dormir e lidar com os em volta deles.

Assim, apesar dos seus horrores — ou talvez por causa deles — os campos de concentração nazistas são lugares para procurarmos neles evidência da qualidade realmente prática da fé. Embora pessoalmente talvez nunca enfrentemos a vida em tais campos, podemos tirar proveito das lições tiradas deles.

MUITOS PERDERAM A FÉ

Um grande efeito dos campos foi a perda de fé. O escritor Philip Yancy explicou: “Alguns sobreviventes perderam a sua fé em Deus. Especialmente os judeus foram suscetíveis a isso: criados para crerem que eram o povo escolhido, de repente descobriram que, conforme um judeu disse dolorosamente: ‘Hitler foi o único que cumpriu as suas promessas.’”

Elie Wiesel descreveu o efeito de presenciar o enforcamento dum rapaz. As SS reuniram os presos diante da forca. Enquanto o rapaz morria devagar, um preso gritou: “Onde está Deus agora?” Wiesel disse: “E eu ouvi uma voz dentro de mim responder-lhe: ‘Onde está Ele? Ele está ali — Ele está ali pendurado nesta forca . . .’”

Também muitos dos que afirmavam ser cristãos perderam a fé. No periódico The Christian Century, Harry J. Cargas expressou nas seguintes palavras os sentimentos de muitos dos que iam à igreja: “O Holocausto é a meu ver a maior tragédia para os cristãos desde a crucificação. No primeiro caso, Jesus morreu, no último, pode-se dizer que o cristianismo morreu. . . . Pode alguém hoje ser cristão em vista dos campos de morte que, na maior parte, foram concebidos, construídos e operados por um povo que se chamava cristão . . .?”

Todavia, havia um grupo cuja fé não foi destruída. As Testemunhas de Jeová entenderam da Bíblia que Deus não causou a iniqüidade dos campos, nem o sofrimento que aflige a humanidade já por séculos. Ao contrário, essas coisas o magoam e provam que os homens não conseguem dirigir os seus passos de maneira independente dele. (Jer. 10:23; Ecl. 8:9) Prometeu na sua Palavra que, num determinado ponto, eliminará a iniqüidade de cima da terra. Desfará também o dano sofrido pelos que têm fé, sendo até mesmo capaz de ressuscitá-los novamente para viverem. — Rev. 21:4; veja também o capítulo: “A Iniqüidade — Por Que Deus a Permite?” no livro Felicidade — Como Encontrá-la.a

FÉ ENTRE MULHERES

Examinemos, por exemplo, o efeito dos campos de concentração sobre as mulheres.

Na sua autobiografia Comandante de Auschwitz, Rudolf Hoess observou (segundo a edição em inglês): “O campo das mulheres, apinhado delas desde o começo, significava a destruição psicológica das massas das prisioneiras, e isto levou mais cedo ou mais tarde ao seu colapso físico. De todos os ângulos, e todo o tempo, as piores condições eram as do campo das mulheres.”

Naturalmente, as condições variavam um pouco de campo para campo, e em épocas diferentes durante a guerra. No entanto, Hoess observou: “Quando as mulheres atingiam o ponto mais baixo, elas se abandonavam completamente. Tropegavam em volta como fantasmas. . . . até chegar o dia em que faleciam quietamente.” O que contribuía para isso era a conduta de algumas presas que recebiam autoridade. Segundo Hoess, “elas ultrapassavam em muito os seus equivalentes masculinos em dureza, sordidez, vingança e depravação”.

Mas Hoess acrescentou: “Um contraste agradável era apresentado pelas mulheres Testemunhas de Jeová, que foram apelidadas de ‘abelhas da Bíblia’ ou ‘vermes da Bíblia’. Infelizmente eram demasiadamente poucas.”

Como suportaram essas mulheres Testemunhas de Jeová os horrores dos campos de concentração nazistas? Como influíram na sua fé? Informação de primeira mão sobre isso foi publicada no livro Sob Dois Ditadores (1949, segundo a edição em inglês), de Margarete Buber.

Ela e seu marido haviam sido membros destacados do partido comunista alemão, no início da década dos anos 1930. Ordenados a comparecerem em Moscou, foram presos por “desvios políticos”. Embora ainda cresse na teoria do comunismo, Margarete Buber foi mandada para um campo siberiano. Mais tarde, ela foi entregue aos nazistas, e por cinco anos serviu no infame campo de concentração de Ravensbrueck para mulheres.

Durante parte deste tempo, ela era Superiora de Bloco, uma presa encarregada dum bloco ou dum barracão de outras presas. A maioria das do bloco dela eram Testemunhas de Jeová (Estudantes da Bíblia). O relato de Margarete Buber fornece informação duma testemunha ocular, uma prisioneira política, que não era Testemunha de Jeová. Seu relato é confirmado por Gertrude Poetzinger, Testemunha de Jeová que ficara presa em Ravensbrueck durante mais de quatro anos, servindo agora com seu marido na sede mundial das Testemunhas de Jeová em Brooklyn, Nova Iorque. O que segue é uma condensação de partes do livro, nas próprias palavras de Margarete Buber, com permissão dela.

Sob dois ditadores

Toda recém-chegada a um campo de concentração passa por um período terrível, no qual ela é abalada completamente, não importa quão forte seja o seu físico, ou quão calmos sejam os seus nervos. E os sofrimentos das recém-chegadas tornavam-se cada vez piores a cada ano em Ravensbrueck, e, em conseqüência disso, o mais alto índice de mortes ocorria entre elas. Dependendo da pessoa, levava semanas, meses ou até mesmo anos até a prisioneira se conformar com o seu destino e adaptar seu ser à vida num campo. É neste período que o caráter da pessoa modifica. Aos poucos, o interesse pelo mundo externo e pelas outras prisioneiras declina.

Acho que não há nada mais desmoralizante do que o sofrimento, sofrimento excessivo, conjugado com humilhação, tal qual o que sobrevêm a homens e mulheres em campos de concentração. Quando as SS golpeavam, você não ousava revidar. Quando as SS maltratavam e insultavam, você tinha de manter a boca fechada e nunca retrucar. Perdera todos os direitos humanos — todos, todos sem exceção. Era apenas um ser vivente com um número para distingui-la dos outros infelizes à sua volta.

Não estou pensando aqui naquelas prisioneiras que ocupavam algum posto e podiam maltratar as que estavam sob sua responsabilidade. Refiro-me às prisioneiras comuns. Se uma parecia obter um bocadinho a mais de comida, um pedaço de pão ligeiramente maior, uma porção de margarina ou de lingüiça ligeiramente maior, seguiam-se imediatamente detestáveis cenas de fúria e ressentimento.

Desde a hora em que saltávamos dos beliches até a hora de formar fila do lado de fora para a chamada, tínhamos 45 minutos para nos lavar, vestir, para arrumar os armários e tomar nosso “café da manhã”. Isto já não seria muito fácil na melhor das circunstâncias, mas imagine o que isto significava numa barraca com outras 100 mulheres, todas correndo em volta, no intento de fazer o mesmo! O ambiente era carregado de linguagem suja e ultrajes.

[Essa é uma descrição parcial de como era a vida dela em Ravensbrueck. Mas, depois, a autora foi designada Superiora de Bloco no Bloco 3, o qual, naquele tempo, alojava as Estudantes da Bíblia.]

Naquela tarde assumi meus deveres no Bloco 3. Havia aqui um ambiente bastante diferente. O lugar era silencioso e cheirava a saponáceo, desinfetante e sopa de repolho. Duzentas e setenta mulheres sentavam-se às mesas. Tão logo entrei na sala, uma mulher alta e loira levantou-se, conduziu-me a um assento e serviu-me uma tigela de sopa de repolho. Eu mal sabia o que fazer.

Onde quer que eu olhasse, havia ao longo das mesas os mesmos rostos modestos e sorridentes. Todas elas tinham o cabelo preso atrás num coque firme, sentavam-se ali em perfeita ordem e comiam a comida como se todas estivessem no mesmo compasso. Muitas delas pareciam ser camponesas, e seus rostos magros eram morenos e enrugados por causa do sol e do vento. Muitas dessas mulheres haviam estado na prisão e no campo de concentração durante anos.

Havia 275 prisioneiras — todas Estudantes da Bíblia. Todas elas eram prisioneiras exemplares e todas elas conheciam as regras e os regulamentos do campo de cor e salteado, e obedeciam a eles ao pé da letra. Cada armário se parecia exatamente com o outro, e todos eles eram exemplos de limpeza e asseio. Todas as toalhas estavam penduradas nas portas dos armários, seguindo exatamente o mesmo padrão; cada tigela, prato, xícara, etc., estava limpo e bem polido. Os banquinhos estavam lavados e imaculadamente limpos, e sempre asseadamente empilhados quando não estavam em uso. Removia-se o pó de toda parte, até mesmo das vigas que atravessavam a barraca, pois nossa barraca não tinha forro e olhávamos direto para o telhado. Disseram-me que alguns dos supervisores das SS vinham com luvas brancas, passando os dedos nas prateleiras e em cima dos armários, e até mesmo subindo nas mesas para descobrir se as vigas não estavam empoeiradas.

Os lavatórios e a sala de banho estavam igualmente limpos. Mas o ponto culminante de todo esse asseio e limpeza eram os dormitórios, cada um contendo 140 camas. O dormitório ali era um feito espantoso. Os colchões de palha e os travesseiros pareciam caixas. Todos os cobertores estavam cuidadosamente dobrados, exatamente do mesmo modo e exatamente do mesmo tamanho, e estavam dispostos sobre as camas seguindo exatamente o mesmo padrão. Em cada beliche havia um cartão com o nome e o número das prisioneiras que dormia nele, e na porta havia uma planta do dormitório, cuidadosamente desenhada, indicando cada beliche e exatamente quem dormia nele, de modo que qualquer pessoa que fizesse inspeção podia dizer sem demora onde cada uma estava.

Enquanto eu era Superiora de Barraca entre as anti-sociais,b o dia todo estivera ocupada com um dever ou outro e perturbada por algum novo temor. Com as Estudantes da Bíblia minha vida corria muito calmamente. Tudo andava como o mecanismo dum relógio. De manhã, quando todas procuravam cumprir suas tarefas antes da chamada, ninguém gritava uma palavra sequer. Em outros blocos, as Superioras de Bloco e as Superioras de Barraca tinham de gritar até ficarem roucas, até conseguirem que as sob sua responsabilidade saíssem ao ar livre e formassem fila, mas aqui o inteiro procedimento decorria silenciosamente e sem uma palavra minha sequer, e o mesmo se dava com tudo o mais — a distribuição do alimento, o desligar das luzes e todo o restante do dia das prisioneiras.

Minha principal tarefa com as Estudantes da Bíblia era tornar a vida delas tão tolerável quanto possível, evitar as tramóias do Líder de Bloco das SS.

Nunca algo foi roubado no Bloco 3. Não havia mentiras nem boatos. Cada uma das mulheres não só era pessoalmente muito conscienciosa, mas considerava-se responsável pelo bem-estar do grupo como um todo. Não levou muito tempo até elas compreenderem que eu era amiga delas.

Uma vez que se estabelecera este relacionamento e eu tinha inteira confiança de que nunca nenhuma delas me trairia, havia muitas coisas que eu podia fazer por elas; por exemplo, evitava que as prisioneiras mais idosas e fisicamente mais fracas ficassem em pé durante horas para a chamada, usando toda sorte de desculpas e truques. Eu não podia fazer isso com as anti-sociais, porque as que estavam mais aptas a agüentar o esforço me trairiam às SS por ressentimento diante da idéia de que alguém estava sendo favorecido.

As Estudantes da Bíblia constituíam o único bloco homogêneo entre as prisioneiras em Ravensbrueck. Quando cheguei ao Bloco 3, tinha apenas uma idéia muito vaga sobre suas convicções religiosas e o motivo de Hitler não gostar delas. Não gostar é uma expressão suave para descrever a atitude dele para com elas; ele as denunciava como inimigas do Estado e as perseguia impiedosamente.

Não levou muito tempo até elas se darem conta de que me converterem era algo muito improvável, mas continuaram a me mostrar sua simpatia e nunca deixaram de esperar que algum dia eu pudesse “ver a luz”. Tanto quanto pude entender, elas criam que toda a humanidade, exceto as Testemunhas de Jeová, seria lançada em breve nas trevas eternas, quando o mundo chegasse a um fim. O Bem triunfaria finalmente sobre o Mal. Nação não levantaria mais espada contra nação, o leopardo se deitaria com o cabritinho; e o bezerro e o leão novo e o animal cevado juntos, e ninguém causaria dano ou destruição em todo o Seu santo monte. E não haveria mais morte, e todos — os sobreviventes — viveriam felizes a partir de então e não haveria fim de sua felicidade.

Esta crença simples e satisfatória lhes proporcionava força e as habilitava a suportar os longos anos de vida no campo de concentração, todas as indignidades e humilhações, e ainda reter sua dignidade humana. Receberam uma causa para provar, e provaram que a morte não as aterrorizava. Podiam morrer pelas suas crenças sem retroceder.

Levavam a sério o Sexto Mandamento, e, por conseguinte, eram oponentes determinados de toda guerra e todo serviço militar. Sua constância neste respeito custou a muitos homens, Testemunhas, a sua vida. As mulheres da seita também se negavam a realizar qualquer trabalho que em sua opinião se destinava a promover o esforço de guerra.

Seu senso de dever e seu sentimento de responsabilidade eram inabaláveis; eram diligentes, honestas e obedientes. As Testemunhas eram, por assim dizer, “prisioneiros voluntários”, pois tudo o que tinham de fazer para assegurar sua libertação imediata era assinar o formulário especial dos Estudantes da Bíblia, que dizia: “Declaro aqui que de hoje em diante não me considero mais Estudante da Bíblia e que não farei nada para promover os interesses da Associação Internacional dos Estudantes da Bíblia.”

Antes de me tornar sua Superiora de Bloco, elas sofreram muito, porque [a famosa ex-superiora de Bloco] Kaethe Knoll fez o máximo que pôde para impedi-las de se empenharem em palestras religiosas entre si. Para impedi-las de conversar sobre isso tudo e de comparar notas — de “estudar a Bíblia”, em suma — havia um tipo de tortura chinesa, e Kaethe Knoll a aplicara com zelo malicioso.

Eu já era sua Superiora de Bloco durante algum tempo, quando descobri que meus “Vermes da Bíblia”, como eram conhecidas no campo, possuíam Bíblias e publicações dos Estudantes da Bíblia. Começaram a trazê-las escondidas em baldes e panos de chão, etc., quando chegavam do trabalho. Quando descobri isso, sugeri que seria menos perigoso se as escondessem em algum lugar no bloco, e esta sugestão foi entusiasticamente adotada. Depois disso, o estudo da Bíblia se sucedia no bloco bem abertamente às noitinhas e aos domingos. E, de noite na cama, antes de as mulheres das SS chegarem com seus cães, cantavam baixinho seus hinos. Minha tarefa era cuidar de que recebessem amplo aviso do perigo e a oportunidade de esconderem suas publicações proibidas.

O risco que eu corria não era pequeno. Era a Superiora de Bloco e responsável por tudo o que ocorria. Esta foi a “Idade de Ouro” da minha vida no campo de concentração — pós-Armagedom, por assim dizer — mas como eu manobrei para sobreviver a uma inspeção após outra, conduzidas por aquele cruel Koegel, sem acabar no Bloco ou nas Masmorras de Punição, não sei até hoje.

Mas havia um jogo ainda mais perigoso que eu fazia. Quando uma prisioneira se sentia doente, ela tinha de relatar isso ao posto médico por meu intermédio. A prova dos nove era o termômetro. Dependendo da leitura, a doente era mandada para a enfermaria, recebia permissão para fazer “trabalho interno” ou era impiedosamente mandada para seus trabalhos normais. Mas, entre as “Testemunhas” havia um bom número de mulheres idosas que, embora não tivessem febre, estavam tão fracas que não podiam realmente trabalhar. O único modo de poupá-las e deixá-las ter um dia de folga, de vez em quando, era eu fornecer relatórios falsos quanto aos números nos grupos, e era isso o que eu fazia. Hesito em pensar no que me teria acontecido se isso fosse descoberto. O que tornava mais difícil era que nós éramos o Bloco de Inspeção [as barracas às quais eram trazidos os oficiais nazistas visitantes. A autora passa a descrever tais visitas não anunciadas:]

Eu informava em tom subalterno apropriado:

“Superiora de Bloco Margarete Buber, N.º 4.208. Informa obedientemente que o Bloco N.º 3 é ocupado por 275 Estudantes da Bíblia e três políticas, das quais 260 estão no trabalho, oito têm serviços na barraca e sete têm permissão para trabalho interno.”

Koegel me encarava com seus olhos azuis lacrimosos, contorcendo seu rosto barbeado, e daí resmungava alguma coisa. Então eu seguia em frente na inspeção de rotina, abrindo uma porta após outra, e os primeiros três armários. E, ao passo que nos aproximávamos das prisioneiras devida e legitimamente presentes, eu gritava “Achtung!”, no que todas elas saltavam de pé como bonecos de mola. Todos os visitantes, quer fossem homens, mulheres, SA, SS, ou não sei o que mais, invariavelmente ficavam impressionados com o brilho das latas e do alumínio. Koegel era geralmente o único que fazia perguntas às prisioneiras. “Por que foi presa?”, e a resposta vinha invariavelmente: “Porque sou Testemunha de Jeová.” Isso era tudo o que perguntava, pois Koegel sabia por experiência que estas incorrigíveis Estudantes da Bíblia nunca perdiam uma oportunidade para uma demonstração [de que eram testemunhas]. Depois disso, os visitantes examinavam o dormitório, e havia invariavelmente exclamações enfáticas diante da ordem impecável que encontravam ali.

Embora a Supervisora Chefe das SS, Frau Langefeld, favorecesse e protegesse as “Testemunhas”, uma das principais supervisoras, uma mulher chamada Zimmer, as considerava como o seu “pesadelo”. Frau Zimmer não se satisfazia com nada; nem mesmo a cama mais exemplar encontrava aprovação aos olhos dela, e ela nunca perdia uma oportunidade para maltratar e intimidar as Testemunhas.

[Para romper a paz e a unidade cristã das Testemunhas, as autoridades colocaram cerca de 100 anti-sociais no bloco.]

Foi como se os lobos baixassem sobre o rebanho. A denúncia, o roubo e a desordem tornaram-se parte e parcela da nossa vida diária. As anti-sociais começaram imediatamente a denunciar as “Testemunhas” pelos estudos da Bíblia e pelas palestras religiosas; roubavam tudo aquilo em que podiam deitar mãos; e, considerando-se representantes da autoridade, comportavam-se geralmente de forma inteiramente agressiva e provocante. E quão triste isso foi para mim! Mas, para o crédito das minhas “Testemunhas”, seja dito que elas me socorriam em minhas dificuldades e me apoiavam de todo modo possível. Graças a elas, conseguimos pelejar durante seis meses — o tempo que durou o tormento — sem dificuldades sérias.

Fiz o melhor possível para isolar as desordeiras. Mantinha as “Testemunhas” em mesas separadas, de modo que pudessem conversar sobre seus assuntos sem o perigo de denúncia, e à noite coloquei as anti-sociais na parte de cima dos beliches e as “Testemunhas”, embaixo. No entanto, quando isso se espalhou, as autoridades — a instigadora do ardil foi Frau Zimmer — devem ter selecionado para nós todas as notórias molhadoras de cama do campo, e noite após noite chovia sobre as inocentes na parte de baixo dos beliches.

Certo dia nossa velha inimiga, Frau Zimmer, veio para inspecionar o trabalho dela. Descobriu imediatamente a separação que eu fazia das ovelhas dos cabritos e virou-se para mim indignada.

“Não precisa pensar que sou cega”, disse ela. “Sei perfeitamente que você defende e protege os marteladores da Bíblia aqui. Não ouse separar os Vermes da Bíblia e as anti-sociais, ouviu?”

Bem, era isso aí; tive de misturá-las todas e esperar o melhor. Foi neste ponto que Jeová interveio. As Estudantes da Bíblia acolheram as anti-sociais como irmãs que não viam há muito tempo: Estavam famintas? Estavam! Gostariam de um pedaço a mais de pão? Gostariam! E assim prosseguiu. Observei com sentimentos confusos esta caridade cristã em operação, mas funcionou. As anti-sociais foram amansadas com bondade e afabilidade, e então começou uma campanha para mostrar-lhes a luz. Num período bem curto de tempo já havia um bom número de anti-sociais — uma cigana, uma polonesa, uma judia e uma política — que se apresentaram ao escritório das SS, declarando que doravante desejavam ser consideradas como Testemunhas de Jeová e exigindo o triângulo lilás na manga de seus vestidos. Quando a coisa ficou ruim demais, as SS apenas se enfureceram e esbravejaram com as convertidas e as lançaram fora. Por fim, as SS ficaram tão aborrecidas, que removeram as anti-sociais do nosso bloco, e a paz sobreveio novamente. Dei um suspiro de alívio, e as “Testemunhas” realizaram uma reunião de oração para render graças a Jeová.

[Nota(s) de rodapé]

a Distribuído pela Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados. Tatuí, SP (1981)

[Nota(s) de rodapé]

b As anti-sociais eram prostitutas, vagabundas, batedoras de carteiras, alcoólatras e outros “elementos inúteis”.

[Foto na página 8]

Gertrude Poetzinger em 1944. Ela estava entre as 275 Testemunhas de Jeová aprisionadas era Ravensbrueek.

[Foto na página 9]

Gertrude Poetzinger hoje. Ela serve na sede mundial das Testemunhas de Jeová.

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