‘Não deixe para amanhã . . .’

VOCÊ acaba de jantar. Promete a si mesmo que esta noite vai arrumar o guarda-roupa, ou a garagem, ou a escrivaninha, ou finalmente dedicar-se a uma daquelas coisas que há semanas ou meses você está querendo fazer.

Mas, por que não descansar um pouco antes de começar?, você pensa. Afinal, acabou de jantar. De modo que você se instala na poltrona e liga a TV — “só por alguns minutos”. Antes de se aperceber, está assistindo ao último noticiário. Lá se foi a noite. Sua intencionada tarefa terá de esperar de novo.

Se você se identificar na descrição acima, poderá pelo menos derivar conforto do fato de que não está sozinho. ‘Deixar para amanhã’, protelar, procrastinar, ou seja lá como quiser chamá-lo, é certamente uma das fraquezas humanas mais comuns. Dificilmente existe alguém que já não tenha dito a si mesmo: “Sei que devia fazer isso, mas . . . ”

“Farei Melhor na Próxima Vez”

A procrastinação se manifesta em nossa vida de muitas formas, algumas trágicas, outras não tão sérias assim. Na verdade, cientistas do comportamento crêem que, visto que muitos casos de ‘deixar para amanhã’ não são realmente muito sérios, é fácil o hábito arraigar-se em nós.

Por exemplo, talvez no fundo você queira muito mandar um cartão de agradecimento aos amigos com quem esteve numa viagem recente. Mas o tempo passa. Antes de se aperceber, passaram-se semanas e meses, e seu cartão ainda não foi enviado. Mas, aparentemente nenhum dano real foi causado. “Farei melhor na próxima vez”, você promete a si mesmo. E aí começa uma luta fadada ao fracasso.

Talvez nem sempre haja uma “próxima vez”. Certa mulher de 25 anos, que por anos hesitara em demonstrar afeição a sua irmã, escreveu: “Muitas vezes quis abraçá-la e beijá-la, mas nunca expressei a ela meus sentimentos. . . . Em 25 de fev. [1983] minha irmã faleceu. Meu mundo desmoronou. Quão lamentável é que ela nunca soube o quanto eu a amava! . . . Se existe amor entre membros da família, . . . demonstre-o! Não deixe isso para depois. Poderá ser tarde demais.”

Deve-se observar, porém, que nem todo adiamento é necessariamente prejudicial.

Em vez de “adiamento” alguns talvez prefiram usar o termo “deliberação”. Leva tempo para amadurecer as idéias e cristalizar os planos. Adiar uma decisão para uma época mais oportuna pode, de fato, ser uma boa decisão em si mesma.

Uma forma mais séria de procrastinação, embora muitos não a considerem como tal, é o tardamento crônico. Isto pode incluir chegar atrasado a compromissos, reuniões sociais, reuniões de negócios ou simplesmente ao serviço. Ou pode envolver morosidade em fazer as coisas a tempo ou dentro de prazos estabelecidos. Isto pode custar uma amizade, um emprego, ou, como se tem dito, até mesmo o casamento da pessoa.

Por Que as Coisas Ficam Para Depois

Visto que a procrastinação aparentemente tem algo a ver com o tempo, a primeira explicação que vem à mente é que os procrastinadores não são pessoas cônscias do tempo ou não sabem controlar o tempo. Assim, supervisores de grandes empresas muitas vezes tentam ensinar a seus empregados certas técnicas de controlar o tempo. Mas, para seu desapontamento, em muitos casos constatam que, na hora de aplicar as técnicas recém-aprendidas, a maioria dos procrastinadores procrastina como sempre. Parece que algo mais está envolvido.

No livro Decision Making (Tomada de Decisões), os co-autores Irving Janis e Leon Mann escreveram: “Aquele que toma decisão quando submetido a pressão para tomar uma decisão vital que afeta seu futuro bem-estar, tipicamente achará penoso se comprometer, porque existem alguns esperados custos e riscos, independente do rumo ou da ação que escolha. Um modo de enfrentar tal dilema penoso é evitar tomar uma decisão.”

O sentimento de inadequabilidade ou incompetência é outra razão do por que muitos procrastinam. “Protelar as coisas funciona qual amortecedor para seu abalado senso de valor próprio”, diz a psicóloga Jane Burka. Para não arriscarem a possibilidade de se saírem mal, eles protelam totalmente a tarefa. Seu medo de críticas os impede de até mesmo iniciá-la.

Especialistas que estudaram o problema da procrastinação indicam outras causas talvez mais sutis. Um subordinado talvez se esteja rebelando contra as normas, os prazos e outras exigências de seu superior por procrastinar. Protelar as coisas até o último minuto pode ser a maneira de a pessoa desculpar seu mau trabalho, pois então poderá dizer: “Se eu tão-somente tivesse mais tempo!” Outros ficam tão intimidados pela dimensão geral de sua tarefa ou pela quantidade de tempo necessária para completá-la que acham que nem vale a pena começar.

Sem dúvida, há muitas razões pelas quais as pessoas procrastinam, e cada um de nós é afetado de maneira diferente. Assim, que pode ser feito para sobrepujar os insidiosos efeitos da procrastinação e do tardamento crônico?

Como ‘Não Deixar Para Amanhã . . . ’

Se já leu livros sobre vencer a procrastinação, provavelmente percebeu que a maioria deles está repleta de exortações como: “Faça-o agora mesmo!”, “Levante-se e comece!”, e assim por diante. Mas, são poucos os leitores que se sentem suficientemente motivados para fazer mais do que se levantar e pôr o livro de lado. Por quê? Porque a maioria desses livros sobre “aprimoramento pessoal” aborda a matéria dum ponto de vista egoísta. Por que preocupar-se com o que outros pensem ou digam? Vá em frente e faça o que você quer.

O problema com tal abordagem é que grande parte do ‘deixar para amanhã’, do ‘jogo de empurra’, e especialmente do tardamento é, para começar, devido à falta de preocupação com outros. Além do mais, se o indivíduo é tão escrupuloso de fazer tudo o que supostamente é bom para ele, para começar mui provavelmente nem seria procrastinador.

Estabeleça Suas Prioridades

Visto que a procrastinação, como vimos, é uma forma de evitação, para vencê-la, a pessoa deve poder ver a razão e o verdadeiro valor da tarefa a executar, bem como sua importância relativa entre as muitas coisas que a pessoa deve ou quer fazer. Isto é o que os peritos em administração chamam de estabelecer prioridades.

Quais são para você as coisas realmente importantes na vida? A que daria prioridade máxima? Para muitos hoje, a promoção pessoal e o progredir ocupam o primeiro lugar na vida. Contudo, os arquivos de centros de aconselhamento profissional contêm muitos casos ilustrativos de homens e mulheres ambiciosos com carreiras promissoras, que repentinamente esbarram num obstáculo, tornam-se procrastinadores crônicos, até mesmo pondo em risco seu futuro. A competição e a pressão para produzir leva-os a duvidar de sua própria capacidade. Passam a ser deliberadamente lerdos, a protelar, a procrastinar. Como se expressou certo jovem advogado: “É medo de julgamento, medo de chacota. Melhor não apresentar nada do que apresentar algo estúpido.”

O antigo Rei Salomão certamente foi um dos que chegaram ao apogeu. Mas ele disse o seguinte sobre tais empenhos: “Eu mesmo vi todo o trabalho árduo e toda a proficiência no trabalho, que significa rivalidade de um para com o outro; também isto é vaidade e um esforço para alcançar o vento.” (Eclesiastes 4:4) Certamente, é fácil protelar algo que seja “vaidade e um esforço para alcançar o vento”, quando se passa a perceber a “rivalidade de um para com o outro”. Dito em linguagem coloquial, as pessoas ‘caem fora quando as coisas começam a ficar pretas’.

Evidentemente, a promoção pessoal pode ser motivadora apenas até certo ponto. Para algo ser considerado realmente importante, para não ser protelado, portanto, deve envolver mais do que o mero interesse próprio. Precisa ter um propósito mais amplo e realmente de valor.

Assim, da próxima vez que você se perguntar por que certas coisas que intenciona fazer são tantas vezes proteladas, pare e pergunte-se: São tais coisas realmente importantes? Servem a uma finalidade útil? E, em caso positivo, que me impede de executá-las?

Verifique Seus Hábitos

Vivemos num mundo apressado, e para a maioria de nós a vida está cheia de coisas a fazer. Algumas destas temos de fazer. Outras gostaríamos de fazer. Ainda outras fazemos mais ou menos por força do hábito. Os procrastinadores crônicos protelam coisas de primeira importância. Muitas pessoas procrastinam em coisas de importância secundária. Mas, mui amiúde é o fazer as coisas ainda menos relevantes que nos torna procrastinadores.

Tome, por exemplo, a questão do tardamento crônico, como forma de procrastinação. Os eternamente atrasados, em geral, sabem da importância do que têm a fazer, e até mesmo gostam de fazê-lo, uma vez começado. Mas, estão sempre atrasados. Os entendidos no campo crêem que esse hábito se aprende cedo na vida, em geral dos pais e irmãos. Ele se manifesta primeiro na escola, depois no emprego e em outras áreas da vida. Para tais pessoas não é uma questão de simplesmente aprender a como controlar o tempo. Elas “devem substituir a idéia de ‘antes tarde do que nunca’ para ‘antes cedo do que atrasado’”, diz o psicólogo Pierre Haber.

É interessante o que a dupla de conselheiros Tony e Robbie Fanning, marido e mulher, tem a dizer em seu livro Get It All Done (Não Deixe Nada por Fazer): “Estar atrasado nada tem a ver com o tempo em si; é uma questão de protelar a hora marcada.” Os retardatários crônicos chegarão atrasados mesmo se tiverem ou se tirarem tempo extra. Para vencer o hábito, os Fannings sugerem mudar mentalmente a hora marcada. Se você tiver que estar numa reunião às 19:00, vise chegar às 18:30 ou 18:45. Talvez ainda chegue atrasado, como de costume, mas em tempo para a reunião.

Existe Ajuda

Muitos são os que, por falta de verdadeira motivação, procrastinam em tentar livrar-se de certos hábitos prejudiciais. Certo homem que fumava três maços de cigarros por dia, por 11 anos, contou a sua experiência: “Fiz pelo menos uma dezena de tentativas sérias para largar, mas todas foram malsucedidas. Toda vez que tentava, eu entrava num período de agonia . . . e sempre fumava de novo.” Outro homem, viciado em jogo por uns dez anos, disse: “Muitas vezes tentei largar o vício, mas o máximo que consegui foi por uns dois dias.” Os repetidos fracassos os levaram a protelar uma nova tentativa. Por fim, no entanto, ambos encontraram a motivação de que necessitavam.

O ex-fumante conta: “Ao estudar a Bíblia com as Testemunhas de Jeová, encontrei muitos textos que falam tanto de limpeza física como espiritual. Também, existe o princípio básico de mostrar amor uns aos outros e tratar outras pessoas como queremos ser tratados. Como pode alguém ficar dando baforadas no rosto dos outros e dizer que segue esse princípio?”

O que fez por ele essa recém-encontrada motivação? “Resolvi parar de uma vez por todas”, disse ele. “Eu pedia a ajuda de Jeová toda vez que sentia vontade de apanhar um cigarro. Para minha surpresa, foi mais fácil do que eu esperava.”

Que dizer do jogador? “Minha esposa começou a estudar a Bíblia”, disse ele. “Ela convidou-me a participar no estudo e eu aceitei. O resultado foi que logo entendi que a jogatina é uma coisa errada.” A verdade bíblica deu-lhe a necessária motivação. Em três meses conseguiu o que vinha protelando há dez anos.

“Quem vigiar o vento não semeará; e quem olhar para as nuvens, não ceifará”, diz a Bíblia em Eclesiastes 11:4. Assim, quer seja incomodado por séria procrastinação, quer por tardamento habitual, é sábio examinar seriamente suas prioridades e seus hábitos. Daí, ‘não deixe para amanhã . . . ’.

[Foto na página 9]

Antes de se aperceber disso, lá se foi a noite. Sua intencionada tarefa terá de esperar.

[Foto na página 10]

Estar sempre atrasado é um mau hábito.

[Foto na página 11]

A pressão pode levar à procrastinação.